A Síndrome de Princesa Isabel
Séculos depois, a história foi contada como se a princesa fosse uma heroína.
O Brasil foi o ultimo pais das Americas a abolir a escravidão e mesmo assim, quando o fez, deixou os negros sem nenhuma garantia: sem casa, sem trabalho, sem direitos, sem nada. Séculos depois, a história foi contada como se a princesa fosse uma heroína.
Herói mesmo foi Zumbi dos Palmares e vários outros negros que lutaram, com a própria vida em muitos casos, para a libertação dos escravizados. Mesmo sendo reconhecidos como guerreiros, nos livros quase nunca ganham o titulo de heróis.
Ainda hoje, a gente continua vendo essa mesma lógica sem sentido ser repetida por pessoas tomadas por uma síndrome de princesa Isabel.
Muitas delas são pessoas de pele branca, ou que se consideram brancas por não conseguir admitir a própria origem, que contratam negras e negros para trabalhar em suas casas por uma merda de salário que mal paga o mínimo para a sobrevivência.
Assistem de perto o sofrimento que essas pessoas passam na vida, sem se abalar muito, e para não se sentirem péssimas consigo mesmas, soltam um discurso que parece ser de reconhecimento dizendo que a pessoa que trabalha para elas é uma batalhadora, uma guerreira. E quase sempre complementam com um “ah, ela é como se fosse da familia.” E assim, colocam a si mesmos no pedestal de heróis e heroínas.
Não há heroismo nisso. Essas pessoas, conscientes ou sem perceber, conseguem olhar só pra si. Mesmo quando ajudam, fazem pra sentir menos culpa ou pra chamar a atenção pra si mesmas, ou uma mistura dos dois.
Pode ser que a Isabel não tenha tido condições de fazer mais do fez, mas não deveria ser tratada pela história como uma heroína que não foi. Quem sabe no dia que entendermos isso, começamos a reconhecer nossos heróis de verdade.
